Agrotóxico: o envenenamento da Casa Comum
Estamos diante de um cenário socioambiental visivelmente degradado e que se encaminha para um colapso planetário. Isso é o que demonstra as diversas informações, resultantes de inúmeras pesquisas produzidas desde a metade do século passado, que apresentam o futuro pouco promissor que tem sido construído pela humanidade. Atualmente, as alterações ambientais são perceptíveis no cotidiano de todos, é notável, por exemplo, as alterações sofridas, nas últimas décadas, no regime de chuvas ou mesmo nas condições climática, além da redução do número e qualidade de fontes de água potável e na perda da biodiversidade local, entre muitas outras. Perante esta realidade, todos os seres humanos são chamados a assumir, com responsabilidade, os danos que suas atitudes e estilo de vida provocaram no refinado equilíbrio ecossistêmico, e a promover as transformações necessárias para reduzir os impactos e a preservar as relações de vida. Neste processo, os cristãos desempenham um papel fundamental, pois o cuidado e proteção com a casa comum é compreendida como uma missão dada ao ser humano por Deus ao criá-lo, onde "O Senhor Deus tomou o homem e o colocou no jardim de Éden, para que o cultivasse e guardasse" (Gn 2,15), portanto "viver a vocação de guardiões da obra de Deus não é algo de opcional nem um aspecto secundário da experiência cristã, mas parte essencial duma existência virtuosa" (LS 217).
           Frente a isso, a Arquidiocese de Maringá, através da ARAS/Caritas, lança luz sobre uma questão de grande impacto socioambiental para a região de sua abrangência, trata-se do altíssimo índice de consumo de Agrotóxico e suas consequências para o equilíbrio e saúde das comunidades locais.
O Brasil, desde o ano de 2008, é o maior consumidor mundial de agrotóxicos, ultrapassando a marca de 1 milhão de toneladas kg/litros por ano. Entre os anos de 2005 e 2015 o mercado mundial de agrotóxicos teve um incremento de 93% no consumo destes produtos, no Brasil este aumento foi de 190%. O estado do Paraná, desde o ano de 2009, é o terceiro estado que mais utiliza agrotóxicos em sua agricultura. A quantidade utilizada no período de 2012 a 2014 representou uma média anual de 12,21Kg/ha, um consumo 34,9% maior que o apresentado para o estado do Rio Grande do Sul neste período. No ano de 2015 o consumo no Paraná foi de 100.572,8 toneladas, e os municípios pertencentes à Arquidiocese de Maringá consumiram um montante de 5.093,4 toneladas destes produtos, o que correspondeu a um aumento de 27,5% em relação ao ano de 2013. Dos cincos municípios do Estado que apresentaram a maior relação entre o número de estabelecimentos que utilizam agrotóxicos e o total de estabelecimentos do município, dois pertencem a nossa Arquidiocese, sendo: Floresta e Itambé. Dos quinze produtos mais consumidos no Paraná, quatro são proibidos na União Europeia (UE); em 2017, o segundo agrotóxico mais consumido foi o Paraquate, proibido desde 2009 na UE pelo altíssimo risco de contaminação, e por provocar morte devido à necrose dos rins e morte das células dos pulmões.
A média nacional per capta do consumo de agrotóxico por ano é de 7,3 litros, para o estado do Paraná esta média é de 8,7 litros. No ano de 2015, assustadoramente, 9 municípios da Arquidiocese tiveram médias superiores a 30 litros de agrotóxico/pessoa/ano, conforme tabela abaixo:
Dados de consumo - litro por pessoa (Cálculo: quantidade de agrotóxico consumido no município / número habitantes) - 2015 |
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Municípios |
Litros/pessoa/ano |
Municípios |
Litros/pessoa/ano |
São Jorge do Ivaí |
75,20 |
Uniflor |
13,76 |
Ourizona |
61,09 |
São Pedro do Ivaí |
11,60 |
Ivatuba |
46,82 |
Presidente Castelo Branco |
7,81 |
Floraí |
45,80 |
Mandaguaçu |
7,48 |
Atalaia |
39,26 |
Jandaia do Sul |
7,36 |
Marialva |
38,74 |
Nova Esperança |
6,61 |
Floresta |
35,36 |
Paiçandu |
3,91 |
Itambé |
31,01 |
Inajá |
2,97 |
Kaloré |
30,31 |
Mandaguari |
2,81 |
Doutor Camargo |
23,84 |
Paranacity |
2,63 |
Cruzeiro do Sul |
18,83 |
Maringá |
1,32 |
Bom Sucesso |
14,60 |
Sarandi |
1,18 |
Marumbi |
14,32 |
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Fonte: cálculo realizado e fornecido pelo Observatório do Agrotóxico UFPR, (19 de julho de 2018).
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           No Estado do Paraná são notificados em média 830 casos por ano de intoxicação por agrotóxico, entretanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) estipula que para cada 1 caso notificado outros 50 são subnotificados. Entre os anos de 2013 e 2017 foram registrados 450 casos de intoxicação por agrotóxico para a Arquidiocese de Maringá, sendo os municípios com maior incidência: Maringá, Marialva, Jandaia do Sul, Sarandi, Mandaguari, Bom Sucesso e Itambé.
           Outro fator alarmante corresponde às causas de óbito, as neoplasias (tumores) ocupam a segunda posição dentre as causas de óbito no Paraná e apresentam taxas crescentes desde a década de 1990, onde 224 municípios do Paraná (56%) evidenciam taxas superiores à média do estado. No ano de 2017 as neoplasias foram a maior causa de morte para os municípios de Doutor Camargo e Floresta, e a segunda maior para Jandaia do Sul, Mandaguaçu, Mandaguari, Marialva, Maringá, Marumbi, Paiçandu, Paranacity e Sarandi. Existem pesquisas científicas que comprovam outros efeitos nocivos causados por agrotóxicos, como a carcinogenicidade, toxicidade reprodutiva, neurotoxicidade, efeitos de desregulação endócrina e mutagenicidade. O glifosato, agrotóxico mais consumido pelo Paraná, foi classificado como provável cancerígeno pela Organização Mundial de Saúde.
           Assim, consciente da gravidade desta realidade e dos seus impactos para a vida e o bem estar das populações dos municípios que constituem a Arquidiocese de Maringá, bem como do papel que a igreja, de forma profética, deve desempenhar em prol da defesa da vida e do cuidado e preservação da nossa casa comum, propomos duas ações práticas de imediato, sendo elas:
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Você pode cuidar da casa comum!